Um público expressivo e animado marcou a passeata realizada na última sexta-feira, 26, intitulada Saúde mental sem muros, uma luta de todos e para todos, organizada pela Rede Psicossocial (RAPS) de Piracicaba, em referência ao 18 de maio, quando se comemora o Dia Nacional da Luta Antimanicomial.

O público acompanhou o rito, desde a concentração na Estação da Paulista, seguida de lanche e atividades expressivas e de alongamento. Finalmente, a caminhada em direção à Praça José Bonifácio, onde foram recebidos ao som do maracatu.

A coordenadora da RAPS, Vandrea Novello, recorda que os hospitais psiquiátricos, até os anos 80, eram verdadeiras prisões, que não colaboravam em nada para melhorar a saúde de seus internados. Muito pelo contrário. Geravam muito medo e intensificavam os problemas. “Além de não ser eficaz, os manicômios privavam os pacientes de sua liberdade. Essa triste realidade só começou a mudar no início dos anos 80, e um Encontro de Trabalhadores da Saúde Mental, em Bauru, em 18 de maio de 1987,começa a definir uma nova política para o setor”, recorda.

Este ano, portanto, está sendo comemorado 30 anos de um processo de transformação intenso no sistema público de atendimento aos doentes mentais, bem como na relação desses indivíduos com a sociedade. “De lá para cá, em Piracicaba, tivemos muitas conquistas que merecem comemoração. É fato que temos muito ainda a fazer, mas podemos afirmar com tranquilidade que vivemos em uma nova realidade, onde as pessoas com problemas mentais têm o livre arbítrio, convivem com seus familiares e recebem um tratamento íntegro e bastante eficaz junto aos CAPS”, enfatizou Vandrea.

MODELOS DE SUPERAÇÃO – Valdemar Aparecido Alves e Sônia Maria Moreira Evangelista são dois exemplos vivos dessa luta longa e dolorosa. Ambos vieram longos anos de suas vidas aprisionados em manicômios de Piracicaba e região. “Era tudo muito triste”, recordam. Sônia conta que foi roubada várias vezes e apanhou muito. “Tomei até chute na barriga”.

Hoje, são atendidos por especialistas no CAPS Bela Vista. Desenvolvem atividades juntos. “Pintamos, brincamos, almoçamos, assistimos TV e temos vários amigos em comum”, relatam. E tem um detalhe que Sônia observa com os olhos brilhando. “Estamos morando junto há um ano e formamos um casal”. Valdemar, todo orgulhoso, afirma com a cabeça.

Raimundo Evangelista Lima, 56, ficou por 9 anos vagando entre o Cesário Motta e o Sayão (dois hospitais psiquiátricos bastante conhecidos e temidos). Superada essa fase, passou a ser atendido no CAPS Vila Sônia. Sair da internação para a vida livre foi uma mudança radical em sua vida. “Eu não tinha vida. Hoje é diferente. Inclusive, estou trabalhando na Casa das Oficinas (unidade auxiliar de tratamento a paciente com sofrimento psíquico intenso), ajudando as pessoas que também enfrentam problemas como os que enfrentei”. Questionado se se sentia feliz, sua fisionomia se transformou. “Me sinto feliz. Me sinto muito feliz”.

Raimundo Evangelista Lima, de frente para a o clique, ao lado da dona Sônia e seu companheiro: cidadãos como todos os demais